Clube
da Luta é um filme sobre um cara que tem insônia (Jack) e um cara
que vende sabões (Tyler Durden). Eles dois participam de um grupo
ultrassecreto de pessoas que regularmente combinam de se bater quase
até a morte. Mas eu não deveria falar desse grupo, porque ele
realmente é supersecreto. Está nas diretrizes dele. Bom, na
verdade, estou a brincar, mas para a maioria das pessoas é apenas
isso mesmo: um grupo de pessoas que adora se bater e vandalizar pra
se opor a sociedade monótona e consumista.
O
tema mais exposto no filme é o capitalismo consumista. Jack vive uma
vida de tédio, trabalhando num trabalho que ele odeia, como a
maioria das pessoas em nossa sociedade. Ele está sempre dopado, sem que consiga sentir nada. Essa é uma parte chave
para a compreensão da ideia do filme. As pessoas que vivem na
modernidade não conseguem sentir as coisas. Como diz Larossa, em
“Linguagem e Educação Depois de Babel”, existem três
obstáculos que impedem as pessoas de sentir, de se deixarem ser
transpassadas pelas sensações: excesso de informação e excesso de
opinião; falta de tempo; excesso de trabalho. O filme sugere
justamente isso. Jack não está dopado pela insônia, ele está
dopado pelo consumismo. Numa cena, ele aparece assistindo comerciais,
num estado onde não está nem acordado nem dormindo.
A
sociedade retratada no filme é uma máquina pensada para garantir a
eficiência do sistema capitalista das frias e robóticas produções
em massa. O filme mostra o lado negativo e desumano dessa
“eficiência”. Tyler Durden afirma que você se torna escravo das
coisas que você possui. Consumidores são indistinguíveis uns dos
outros. A subjetividade é cada vez mais deixada de lado. É o que
Canclini chama de “vozes anônimas”, em
seu livro
“Diferentes, desiguais e desconectados”. O
narrador diz que tudo são cópias, nada é autêntico. Sendo
assim, nós somos manipulados pela propaganda a achar que as coisas
que consumimos são diferentes entre si, mas são todas iguais. Ter
consciência disso faz a vida parecer vazia
e sem
finalidade a
não ser a de servir como
escravos do sistema.
Jack
“acorda para a vida” depois de sofrer um acidente de carro. Ele
decide “reagir” ao sistema, mas ele não poderia reagir como a
maioria das pessoas faz. A maioria das pessoas escolhe as fugas
que são determinadas pelo próprio sistema, como
é o caso da bebida, dos jogos, produtos para entretenimento, etc. É
quando ele se muda para outro apartamento totalmente diferente do seu
anterior, seguindo uma lógica oposta à de eficiência propagada
pelo mercado. É
nesse ambiente que Tyler, líder do Clube
da Luta,
vai o convencendo a lutar contra o consumismo e
retomar sua identidade.
Ainda
não falei do Clube da Luta em si. Tyler,
o líder do clube, fala como se o capitalismo estivesse transformando
os homens em mulheres, tornando-os
dóceis e frágeis (perfil
retratado no personagem Bob, que perde seus testículos e ganha
men-boobs,
devido a uma doença).
O
Clube da Luta funciona como uma espécie de escapismo para esses
homens, que no dia a dia não podem exercer sua masculinidade. O
Clube é uma alternativa de fuga que não é produzida pelo sistema
vigente. Só
que, com o tempo, O Clube passa a replicar a sociedade consumista. A
masculinidade pregada por ele é como se fosse um produto como
qualquer outro. Tudo
contra
o que Tyler se rebelava, ele terminou reproduzindo: os homens do
clube se tornaram cópias uns dos outros, até
perder os próprios nomes e
ameaçar os testículos uns
dos outros.
Surge
assim o Projeto Mayhem, que tem como ambição perseguir políticos,
corporativistas, e o sistema vigente em
geral. Assim,
o Clube da Luta, que antes parecia inofensivo e inocente apesar da
violência, torna-se algo mais sistematizado e perigoso, tão
ruim e
supressor
quanto o próprio capitalismo ao qual eles estavam se opondo.
No
fim das contas, Tyler é um alter ego do Jack. O
arco inicial retrata uma realidade capitalista, já o posterior
retrata uma realidade fascista. Ambas semelhantes. E essa acredito
que seja a crítica tecida pelo filme. Tanto para o capitalismo
quanto para o fascismo, o ser humano é apenas uma estatística, um
número, uma pequena parte anônima
de um grande todo, onde
pessoas
são
vistas como
objetos e não como sujeitos. A
questão do alter ego entra pra reforçar essa ideia de que o
capitalismo e o fascismo são a mesma coisa, com “rostos”
diferentes.
Jack... ou Tyler?